Texto: Victor Wilson Madeira de Oliveira
Gregório Duvivier em seu programa Greg News da HBO fez uma grande defesa da não candidatura de Ciro Gomes (PDT) ao Palácio do Planalto neste ano. Durante o episódio, ele abordou temas que deporiam contra o presidenciável como a sua vida partidária pregressa, o suposto temperamento difícil, entre outros. A grande defesa de Duvivier é que a eleição deste ano seja feita em apenas um turno com todos os pré-candidatos renunciando as suas candidaturas em favor de Lula, que teria a capacidade de defender a democracia brasileira contra Bolsonaro. Segundo o apresentador, esse turno único conseguiria garantir a manutenção da democracia já que tiraria de Bolsonaro capacidade de articular qualquer tentativa de golpe.
Ciro Gomes, em seu canal no YouTube, reagiu ao vídeo. Ele começa dizendo da importância da liberdade de expressão que o humorista deve ter para criticar os políticos. As pessoas que participam da vida pública estão sujeitas às críticas e é importante para a democracia que assim o seja. Porém, é fundamental observar restritamente a verdade para que a crítica faça sentido. Como disse Daniel Moynihan “todos têm direito à própria opinião, mas não têm direito aos próprios fatos”.
React do Cirão
Gregório Duvivier argumenta que Ciro não tem bons predicados para exercer a liderança de um país como presidente. Ele então traz uma velha questão: o temperamento destemperado de Ciro. Para ilustrar isso, Duvivier afirma que Ciro teria sido demitido do cargo de Ministro da Fazenda do Governo Itamar porque dava declarações muito polêmicas e que isso, segundo avaliações de lideranças do PSDB (partido de Ciro na época), estava atrapalhando a eleição de Fernando Henrique Cardoso. Porém, não foi isso o que ocorreu. Como bem é explicado no react, Ciro ficou no cargo até o último dia de governo e gozava de grande prestígio do Presidente Itamar, sendo uma escolha pessoal deste, e não uma indicação de algum partido.
Nesse mesmo sentido, Gregório traz uma crítica descontextualizada que Ciro Gomes fez a Marina Silva, dando a interpretação que Ciro teria “nojo” da política ambiental de Marina. No react, Ciro reafirma seu profundo respeito a um dos maiores nomes da política nacional e em especial da questão ambiental, Marina Silva. A crítica de fato foi feita, mas se tratava de um aspecto da política ambiental defendida pela ex-senadora que é a de colocar o agronegócio como o grande vilão nacional, o que não é. Ciro lembra do óbvio, que o agronegócio tem uma importância central em nossa economia.
Outro ponto criticado pelo humorista foi os nomes, como Datena, Bivar, Aldo Rebelo e Cabo Daciolo, que vêm apoiando a pré-candidatura de Ciro. Ciro afirma que não há nada que pese contra essas pessoas e questiona o arco de alianças formado por Lula. Alckmin, que será candidato o vice e disse que o PT é uma organização criminosa, que a candidatura de Lula em 2018 era a volta à cena do crime e que prisão de Lula era importante para estabilidade do país. Além disso, Lula traz os líderes do golpe contra Dilma (Renan, Eunício Oliveira, Geddel) para sua aliança.
Ciro Gomes suscita algo importante sobre a crítica de Gregório Duvivier sobre o apoio de Cabo Daciolo. Para o presidenciável, as críticas feitas a Daciolo pode revelar um certo preconceito elitista que parte da sociedade, inclusive parte da esquerda tem. Daciolo tem origem humilde e professa a crença cristã, tão comum à população mais pobre do país. Ao debochar de uma fé popular, certa elite artística e intelectual, de forma arrogante, pode afastar essa população de candidaturas progressistas e aproximar de Bolsonaro que sabe fazer uma boa leitura do sentimento popular. É muito importante estar atento a essa questão.
Duvivier sugere turno único para as eleições de 2022
O ponto central da argumentação de Gregório em favor da não candidatura de Ciro é que o momento é de grave ameaça à democracia. A única forma de enfrentar essa ameaça, segundo o humorista, é que todos renunciem as suas candidaturas para dar ao Lula mais chances de ganhar a eleição já no primeiro turno, mesmo que com margem apertada, e assim afastar o perigo que Bolsonaro representa. O que Gregório propõe, na prática, é forçar que a eleição de 2022 seja em turno único.
É importante lembrar da importância da eleição em dois turnos. Há vantagens muito interessantes nesse sistema. No primeiro turno temos a possibilidade de debater mais amplamente sobre diferentes projetos de país, discutindo temas sensíveis para o dia a dia da população, temos a chance de ter um voto mais consciente, o voto pelo melhor. Esse debate contamina o turno seguinte, de modo que os derrotados levam parte de seus projetos aos postulantes para que sejam incorporados, aprofundando, assim, as propostas ainda em disputa. O segundo turno também pode dirimir contestações, pois ali se decide entre “a” ou “b”. Fica claro quem ganhou, as forças políticas do país tomam uma posição.
Nesse sentido, Ciro Gomes foi bem feliz ao afirmar que a renúncia de todos em favor de Lula é algo atentatório contra a própria democracia, pois fere de morte o debate sobre o futuro do país. Além de que uma vitória apertada no primeiro turno (caso Lula vencesse ainda no primeiro turno, com margem apertada) não abafaria polêmicas ou contestações. A verdade é que Bolsonaro não precisa de mais tempo para planejar um jeito de atentar contra as eleições, ele já vem criando esse clima desde o primeiro ano de seu governo.
De fato, Gregório Duvivier não argumenta contra o Projeto Nacional de Desenvolvimento, pelo contrário, diz que é o que Ciro tem de melhor. Ele avança e diz que renunciar à candidatura seria uma maneira de colocar esse projeto em prática. Porque Ciro e seus apoiadores poderiam pressionar para que isso acontecesse. Como salientou Ciro, Duvivier deve pensar que a missão do Ciro seria fornecer um programa de Governo para Lula que, não só não tem um projeto, como também não tem interesse em contrariar interesses hegemônicos que sustentam um modelo macroeconômico herdado desde Fernando Henrique Cardoso.