Apesar dos êxitos sociais e econômicos ocorridos durante o recente ciclo de commodities, bem aproveitado pelas gestões lideradas pelo Partido dos Trabalhadores, a dimensão ambiental da gestão pública nacional vem acumulando fortes desgastes.
A inconciliável relação entre crescimento/desenvolvimento econômico e conservação dos recursos naturais parece chegar a um paroxismo quando a economia está em amplo crescimento, especialmente em um país com uma matriz de exportação de caráter primário, como a que caracteriza a Brasileira. Apesar do Brasil ter uma matriz energética de base hidráulica, considerada limpa por uns e não tão limpa por outros, a expansão da economia com nossa matriz de exportação tem significado desmatamento via expansão da fronteira agrícola, atividades de mineração e empreendimentos para incrementos à geração de energia.
O recente crescimento pelo qual passou a economia brasileira, impulsionado pelo ciclo de commodities, também trouxe consequências importantes para as políticas de conservação dos recursos naturais. Para além de obras transformacionais como hidroelétricas e a transposição do Rio São Francisco – não entrando no mérito da necessidade destas obras — houve casos de flexibilização da legislação ambiental em todos os níveis da federação – municipal, estadual e federal — sendo a reforma do código florestal o evento que melhor reflete este processo de tornar mais permissiva a regulamentação dos usos diretos ou indiretos dos recursos naturais. Portanto, setores fortemente identificados com a conservação do meio ambiente, a exemplo de ambientalistas e cientistas da conservação, estão descontentes e demonstram alinhamento com propostas mais identitárias que trazem a dimensão ambiental como prioridade central.
Por trás da dificuldade em subverter a gestão de meio ambiente no Brasil está escondido o ciclo vicioso de crescimento dos níveis de consumo a reboque de cada fase de valorização dos principais produtos de exportação brasileiros. O aumento das importações de bens de consumo não produzidos no Brasil e de altíssimo valor agregado para servir à aspiração da população gera um déficit de US$100 bilhões/ano. Assim, o Brasil, por não produzir estes bens (e.g. eletrodomésticos, celulares, computadores, peças para montadoras de carros etc), depende dos produtos de mineração e do agronegócio para aliviar suas contas externas. Produtos da mineração e do agronegócio são os que deixam sérios passivos ambientais para as futuras gerações, a exemplo da expansão da fronteira agrícola e poluição de corpos d’água (e.g. Crime de Mariana, em 2015). Mesmo com possíveis aumentos no nível de eficiência na produção de elementos primários, haverá necessidade crescente de sua expansão para equilibrar nossas contas externas, frente à ampliação dos níveis de consumo da população, em uma perspectiva de crescimento econômico.
Portanto, não é possível pensar a gestão ambiental de forma identitária e pouco orgânica. A gestão ambiental será bem conduzida se estiver de mãos dadas com outros setores da economia. Daí emerge a necessidade da construção de um projeto nacional de desenvolvimento em que a gestão ambiental tenha lugar de destaque e se harmonize com os setores produtivos do país, diante da clara relação de interdependência.
Percebe-se que o prefixo eco, compartilhado tanto pela ecologia como pela economia, vem do grego oikos que significa casa. Já logia (de ecologia) deriva de logos que significa estudo, enquanto mia (de economia) vem de nomos, que significa gestão. Enquanto a ecologia estuda e descobre a importância e funcionalidade do meio ambiente, a economia se encarrega de sua gestão.
Portanto, ecologia e economia são conceitos que deveriam caminhar juntos. Como toda a nossa existência depende diretamente dos padrões e processos ecossistêmicos, a conservação da natureza e a provisão de seus serviços — serviços ambientais — prestados ao homem deveriam ter um local de destaque em quaisquer planos de governo. Por exemplo, bastou uma atípica estiagem no sudeste brasileiro para que os preços da energia elétrica subissem e pressionassem as taxas de inflação, impactando, em muito, não só a estabilidade econômica como política dos últimos semestres do governo Dilma Rousseff.
Para diversificar a matriz produtiva brasileira e diminuir nossa dependência de produtos primários de exportação é emergencial que o Estado brasileiro coordene e estimule uma política moderna de substituição de importações em áreas estratégicas em que o país é naturalmente vocacionado; podendo impulsioná-las por encomendas estatais, a exemplo da saúde e petroquímica.
O estrangulamento da gestão ambiental não será resolvido de forma inorgânica e sem o empoderamento do Estado brasileiro.
A gestão ambiental deve ocupar e se conectar com um grande projeto de país. Este projeto não é conciliável com propostas de liberalização extrema da economia exemplificada pela independência do Banco Central (medida recentemente defendida por porta-vozes de algumas correntes ambientalistas).
Um simples exemplo é a manutenção e ampliação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. O custo cada vez maior do, ainda incipiente, SNUC, pode ser apenas coberto por uma folga orçamentária vinda de um Estado capaz de incrementar maiores investimentos. Este fenômeno só advirá sustentavelmente da diversificação de nossa matriz produtiva. Senão, dependeremos ciclicamente dos preços internacionais dos produtos primários que exportamos a despeito da crescente dilapidação de nosso patrimônio ambiental.