Dentre os vários temas tratados pelo atual pré-candidato trabalhista, há dois assuntos debatidos por Ciro Gomes há tempos e com frequência, para os quais ele tenta chamar a atenção do povo brasileiro: a necessidade de rever o percentual do orçamento brasileiro destinado para as despesas com a dívida pública e a necessidade da taxação de lucros e dividendos no Brasil.
Há décadas os representantes neoliberais nas políticas econômicas brasileiras tentam sufocar esses dois debates, mas (talvez diante do pavor a eles representado pelo crescimento da pré-candidatura de Ciro Gomes) nesta semana, de forma repentina, os brasileiros se surpreendem ao saber que algumas forças trouxeram esses dois assuntos para a pauta.
Rodrigo Maia, na presidência da câmara dos deputados, afirmou estar considerando criar um grupo de trabalho para analisar a volta da taxação sobre lucros e dividendos.
Sobre a auditoria da dívida pública, houve decisão judicial tomada por um magistrado do Distrito Federal nesta segunda-feira, determinando que o Congresso Nacional instaure em até 30 dias uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para auditar a dívida pública brasileira.
Os potenciais benefícios dessas duas medidas são grandes e esses são debates que certamente precisam ocorrer no país, mas quais teriam sido os motivos para que essas forças políticas e jurídicas, neste momento do país, repentinamente decidissem pautar os dois assuntos? É possível confiar que importantes debates como esse serão tratados à luz do interesse real do povo brasileiro, neste momento tão próximo das eleições, por congressistas protagonistas do caos criado no governo Michel Temer?
Desde 2016, o país convive com as reformas propostas pelo governo Michel Temer e com participacão de Rodrigo Maia que, por baixo da aparência de eficiência e modernização, demonstraram-se mudanças anti-povo, anti-pobre e anti-nacionais. No mesmo período, foram várias também as decisões judiciais aparentemente neutras que se converteram em malefícios ao Brasil. Diante de tantos exemplos assim, os brasileiros parecem ter todos os motivos para desconfiar dos motivos de Rodrigo Maia e dos impactos da decisão judicial que determina a CPI, pelo temor de ver assuntos tão importantes serem encaminhados com as piores decisões possíveis. Além disso, ter havido decisão judicial que determine uma CPI (comissão parlamentar de inquérito) é fato que infelizmente desestabiliza ainda mais o equilíbrio entre os poderes no momento em que vivemos e reforça a ideia de que o judiciário brasileiro extrapola seus limites constitucionais.
No caso da taxação de lucros e dividendos, o grupo de trabalho formado por Rodrigo Maia contaria, além dele, com deputados do DEM e de outros partidos que dão apoio ao governo (como o PSDB e PMDB). É bom lembrar que o Brasil contava com a cobrança de imposto sobre lucros e dividendos até 1995, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso editou uma medida provisória, em desfavor da cobrança, que foi posteriormente aprovada pelo Congresso e convertida na lei 9.064/1995. Ou seja, há a possibilidade dos partidos que apoiaram o fim da cobrança (PFL, PMDB, PSDB) serem os mesmos que agora discutirão o retorno do imposto, já que DEM, PSDB e PMDB dão apoio ao governo atual.
Também já houve no país uma CPI da Dívida Pública, finalizada em maio de 2010. O deputado relator à época, Pedro Novais (PMDB-MA) apresentou relatório contestado por outro grupo de deputados, visto que as discussões não envolveram uma auditoria completa, que contemplasse também as possíveis ilegalidades cometidas nas dívidas de estados e municípios. E, neste momento, há a possibilidade de que a base governista do PMDB novamente seja a responsável pela relatoria e pelos trabalhos de uma comissão parlamentar de investigação sobre o assunto.
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Para Ciro Gomes, a revisão das despesas orçamentárias com a dívida pública está no centro de uma reforma fiscal que o país necessita fazer, pois considera-se que uma única despesa onera cerca de metade do orçamento brasileiro, dificultando em muito a destinação de mais dinheiro nos investimentos do Estado em educação, saúde, infraestrutura, saneamento e os demais gastos correntes para a população.
Além disso, Ciro menciona a existência de possíveis ilegalidades cometidas nas negociações que estão por trás do valor da dívida pública, pois o arranjo institucional da economia brasileira (como a taxa de juros reais, por exemplo) por vezes parece tão absurdo a ponto de desconfiarmos que seu verdadeiro sentido seria privilegiar esse gasto e essa remuneração aos poderosos credores da dívida, em detrimento de privilegiar os investimentos do Estado com a população.
Já a taxação de lucros e dividendos é debatida por Ciro Gomes como uma ideia relacionada a reforma mudança tributária necessária ao país, em que seria preciso diminuir e simplificar os impostos no momento de produzir (ao contrário do que ocorre hoje em dia no Brasil, em que uma empresa é onerada sobretudo no momento de produzir e vender) e discutir a incidência dos impostos no momento em que se apuram os lucros e os dividendos.