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O globalismo e a desigualdade mundial: planeta dos bilionários

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Há alguns dias, a Oxfam, ONG britânica, divulgou em Davos um levantamento que denunciava uma realidade no mínimo questionável: cinco brasileiros bilionários possuem um patrimônio equivalente ao da metade mais pobre da população brasileira. Ou seja, cinco brasileiros específicos têm cerca do mesmo patrimônio que cem milhões de brasileiros juntos. O levantamento foi feito com base em dados da revista Forbes e informações sobre a riqueza em escala global de relatórios do banco Credit Suisse.
O cenário se agrava quando analisamos as conclusões que a pesquisa apresenta em escala global. 80% da riqueza gerada no ano passado chegou a apenas 1% da população. Isso, definitivamente, não é fruto do mero acaso ou exclusivamente do esforço de um grupo seleto de super ricos com grandes habilidades de decisão. É fruto da realidade em que o mundo se encontra hoje, realidade esta que abre margem para os mais graves tipos de reação que as sociedades comportam.
É fruto da política convertida em politicagem; da atuação estatal em nome da manutenção da concentração de renda e não do combate a ela; do corporativismo mesquinho; e, talvez, seja esta uma das fases finais do capitalismo globalizado: o momento em que minorias super ricas tomam Estados para si de forma tão entranhada e profunda que a realidade não só parece imutável como soa “natural”. Converte-se o planeta, ou a maior parte dele, numa espécie de plutocracia de oligarcas tomando decisões mundiais e domésticas com base no que for melhor para o aumento de seus lucros anuais à revelia do que for melhor para a maioria.
Cria-se, enfim, uma “oligarquia global”. Naturalmente, o buraco é mais embaixo nos países de origem colonial, que lidam pelo menos duas vezes mais com elites mesquinhas se valendo de sua máquina pública: uma doméstica e uma internacional.
Tal realidade produz desigualdades gritantes. É incompatível com a própria humanidade que patrões façam em três dias mais do que um trabalhador empregado em tempo integral num mês, como denuncia a realidade no próprio Reino Unido, de acordo com o The High Pay Centre. Isso permite que percebamos que o problema, ainda mais grave no Brasil, não é uma manifestação isolada desse tipo de aberração.
Se os empregos se reduzem a meras commodities (de forma a satisfazer o baixo custo de produção exigido pelos patrões que visam maximizar lucros) e, por consequência, os trabalhadores e sua mão de obra não são mais que ferramentas a uma classe avantajada, as interpretações dessa realidade são as mais distorcidas: alguns chegam a culpar fenômenos como a imigração pela falta de emprego (e, portanto, de renda; e, portanto, de necessidades básicas), representando o pior e mais grotesco lado dos nacionalismos, mesmo que quem permita a conversão dos trabalhadores e trabalhadoras em meras partes descartáveis sejam os próprios operadores do poder, quando suas ações não visam melhorar a qualidade de vida da população e sim satisfazer a interesses diferentes.
A única defesa que as populações dos países têm contra a investida das minorias super ricas e organizadas é, justamente, organizar-se. Lembrando que essa é uma realidade na qual se ameaçam todas as classes abaixo do 1% avantajado.
As classes médias se corroem e as classes baixas, sob imposição, entram em conflito por qualquer fonte de renda, crescendo conforme as classes médias são destruídas (no caso brasileiro, de forma mais atenuada, onde contamos com treze milhões de desempregados, estressando o mercado de trabalho nacional). Portanto, com a “ressurgência” dos Estados-nação como mecanismo de defesa contra as mesmas elites que dos mesmos Estados se apossaram, os nacionalismos podem ser também uma reação que serve como resistência e não como elemento divisor dos povos: defender o bem público e nacional da investida corporativista e mesquinha dos detentores de parcelas humanamente impraticáveis de riqueza.
Mesmo porque as condições de empreender seguem absolutamente nacionais e, portanto, os problemas (também nacionais) que os Estados deixam de resolver em nome de interesses tidos como mais importantes que os de suas populações continuam existindo independente do sucesso das “bolsas de valores” ou qualquer nova medida que enriqueça os já enriquecidos.
Há aqueles que acreditam que o mundo esteja globalizado, mas mesmo esta afirmativa se apresenta insustentável ao compararmos as condições de empreender de um brasileiro às condições de um angolano ou às condições de um alemão.
Portanto, quando uma minoria organizada toma mais de 50% da riqueza mundial e recebe em suas mãos a literal possibilidade de erradicar a miséria sete vezes só com lucros gerados em apenas um ano (ou seja, em 2017, a classe bilionária global, composta por 2.043 indivíduos, com 43 desses sendo brasileiros, viu sua riqueza aumentar em US$ 762.000.000.000,00; setecentos e sessenta e dois bilhões de dólares), temos muito a observar. O que não temos é evidência de um sistema econômico triunfante.
Trata-se, ao contrário, de um sistema econômico falido e que condiciona à estagnação social dos trabalhadores, isso quando não condiciona ao completo oposto da ascensão social. O caso brasileiro expõe bem os efeitos que um Estado comprometido com interesses plutocratas tem: o filho do topo da pirâmide social tem 14 vezes mais chances de se manter onde está que o filho da base tem de ascender. É hora de reimaginar pelo menos o papel do Brasil nisso tudo e decidir se a mão de obra de nossa gente não passa de uma mercadoria sem relação com seu bem estar ou se seu trabalho merece a dignidade apropriada.